Uma noite de sono possui poderes restauradores altamente positivos para a saúde. Para muitos profissionais, o sono de qualidade está no mesmo patamar que a alimentação nutritiva e a prática de exercícios físicos, como impulsionadores de uma vida saudável. Mas de que forma o sono influencia as diversas áreas da nossa saúde? Quais são os critérios que definem um sono de qualidade? Que medidas podem ser adotadas para combater a insônia e aumentar a qualidade do sono? Afinal, como dormir melhor? É disso que esse texto trata.
O sono é vital para todos, independentemente da idade. Mas o sono desempenha um papel especialmente crítico para as crianças. Isso ocorre porque o sono afeta vários aspectos do processo de maturação.
Um estudo da Penn State University encontrou ligação entre obesidade infantil e sono insuficiente. Isso ocorre porque o sono ruim pode afetar negativamente a leptina, um hormônio criado por nossas células adiposas que nos diz quando parar de comer. Ao tornar o sono uma prioridade desde o início, os pais dão aos filhos uma chance maior de evitar a obesidade infantil.
Analisando atletas adolescentes, outro estudo descobriu que estes têm uma chance 68% maior de evitar lesões se dormirem o suficiente, em comparação com adolescentes que dormem menos de 8 horas por noite.
A relação entre crescimento e sono é bem conhecida, mas não custa lembrar. O hormônio do crescimento é secretado principalmente durante a fase R.E.M. do sono, período mais associado aos sonhos. Por outro lado, sono insuficiente pode sufocar o crescimento.
Considerando as conclusões de 864 artigos publicados, a Academia Americana de Medicina do Sono desenvolveu recomendações de consenso para a quantidade de sono necessária para promover a saúde ideal em crianças e adolescentes. O tempo recomendado a cada 24 horas, incluindo os cochilos, é:
O sono atua como um reforço imunológico natural. Neste período, o corpo produz citocinas – pequenas proteínas que têm um papel fundamental na comunicação do sistema imunológico e na regulação de várias funções biológicas através da sinalização. As citocinas também têm como alvo infecções e inflamações, criando uma resposta imune para ajudar a combater doenças e infecções.
Quando sofremos com insônia, o corpo produz menos citocinas. Muitos estudos mostram que níveis desequilibrados de citocinas podem contribuir significativamente para o avanço das doenças autoimunes e infecciosas.
Um estudo recente mostrou que os participantes que conseguiram dormir uma noite inteira registraram níveis mais altos de ativação das células T em comparação com os participantes que não dormiram o suficiente. Ao mesmo tempo, a privação do sono impede as células T de responderem com eficiência – e torna mais difícil para o organismo lutar contra doenças.
As células T são glóbulos brancos que desempenham um papel crítico na resposta do sistema imunológico a certos patógenos. Sua ativação é um passo importante na maneira como o corpo lida com invasores, com as células T atacando e destruindo células portadoras de vírus e bactérias, por exemplo.
No entanto, é necessária uma boa noite de sono para que as células T funcionem da melhor maneira possível.
Como os dados mostram, a privação do sono torna o corpo menos resiliente, afetando tanto a prevenção quanto o enfrentamento de ameaças. Isso torna o sono de qualidade todas as noites recomendável para a manutenção de um corpo saudável. No caso de pessoas resfriadas, o descanso é uma ferramenta natural e instintiva para o corpo reduzir o estresse e acelerar sua reparação.
Relativamente conhecida, a melatonina é um hormônio produzido pelo nosso corpo que atua como um dos principais reguladores do sono. Mas o impacto desse hormônio na saúde vai muito além de sua influência nos ciclos sono-vigília. Uma das áreas em que ela tem influência é na proteção contra obesidade e disfunção metabólica.
Pesquisas demonstram que a falta de melatonina está ligada a uma redução na eficácia da leptina, um hormônio que controla a fome sinalizando saciedade. Restaurar a melatonina para níveis saudáveis pode melhorar a eficácia da leptina, reduzir a ingestão de alimentos, diminuir o peso corporal e reduzir as reservas de gordura não saudáveis no corpo.
A melatonina também afeta o quão bem a gordura marrom funciona para manter o metabolismo nos trilhos. A melatonina está envolvida no processo pelo qual o corpo converte gordura branca em gordura marrom. Nossos corpos contêm vários tipos diferentes de gordura e desempenham funções diferentes. Certos tipos de gordura realmente trabalham para queimar energia em vez de armazená-la. A gordura branca armazena energia, a gordura marrom e bege na verdade queimam calorias e mantêm a insulina funcionando corretamente, ajudando a regular o açúcar no sangue e protegendo contra a obesidade.
Manter um ciclo consistente de vigília e sono e proteger os ritmos circadianos diários de interrupções (fazendo coisas como se proteger contra muita exposição à luz à noite) são maneiras de incentivar a produção natural de melatonina do seu corpo, o que, por sua vez, pode ajudar seu corpo a fazer mais dessas gorduras que promovem a perda de peso.
A formação da memória depende da “plasticidade” do cérebro (capacidade de modificar sua organização estrutural e funcionamento em resposta a estímulos). De fato, agora existem muitos dados descrevendo a plasticidade cerebral dependente do sono em vários níveis, complementando as evidências de mudanças no comportamento ligadas ao sono.
O aprendizado motor também está associado a uma reorganização da memória em larga escala em várias regiões do cérebro, permitindo que movimentos motores qualificados sejam executados mais rapidamente, com mais precisão e mais automaticamente após o sono. Essas descobertas têm implicações importantes para a compreensão da base cerebral de aperfeiçoamento das habilidades da vida real e também podem significar um papel potencial para o sono na reabilitação após danos cerebrais.
O cortisol é considerado o principal hormônio do estresse do corpo. E, como quase todos os hormônios, o cortisol tem um ritmo diário de 24 horas. O cortisol começa a aumentar gradualmente na segunda metade da noite de sono, acelera ao acordar e atinge o pico às 9 horas. A partir desse momento, o cortisol diminui gradualmente ao longo do dia, atingindo seus níveis mais baixos por volta da meia-noite. A atividade do eixo HPA (hipotálamo-pituitária-adrenal), que estimula e produz cortisol de maneira inversa à melatonina, reduz seus níveis mais baixos à noite, bem na hora de dormir. Dessa forma, o cortisol desempenha um papel crítico nos ciclos de vigília/sono: estimulando a vigília pela manhã, continuando a manter a atenção durante o dia, diminuindo gradualmente para permitir que a unidade de sono interna do corpo e outros hormônios – incluindo adenosina e melatonina – aumentem e ajudem a trazer o sono.
Quando a pessoa tem estresse crônico, ela tende a manter os níveis de cortisol aumentados durante o dia todo, inclusive à noite. Isso inibe a liberação da melatonina, o que leva a uma deterioração na qualidade do sono.
O sono pode ser descrito como uma construção multidimensional. Assim como a atividade física pode ser avaliada em termos de frequência, intensidade, tempo e tipo, o sono também pode ser descrito em termos de duração, qualidade, tempo e variabilidade. Estudos apontam que cada característica do sono tem um efeito importante e único sobre a saúde, da mesma forma que diferentes características da atividade física contribuem para os resultados da saúde.
Mas, para obter essas recompensas, é preciso fazer mais do que apenas evitar a insônia e somar horas. É preciso determinar se o sono é de uma qualidade suficientemente alta e, para isso, convém acompanhar esses três fatores críticos:
O sono de alta qualidade é definido, em parte, por estar adormecido pelo menos 85% do tempo em que se está na cama. Isso significa limitar o uso do laptop e interromper a exibição de TV na cama, pois essas atividades podem dificultar o relaxamento e o sono à noite.
Especialistas dizem que a capacidade de adormecer em 30 minutos ou menos é uma boa indicação de que a qualidade de sono é alta.
O hábito de acordar várias vezes durante a noite pode deteriorar a qualidade do sono. Assim, quanto menos vezes ele for interrompido para idas ao banheiro ou similares, melhor.
A regulação do sono é, em grande parte, realizada por um processo de busca de equilíbrio (homeostase). A força desse processo depende da quantidade de tempo decorrido desde o último período de sono. A pressão homeostática para dormir aumenta à medida que a pessoa permanece acordada. Quanto mais se mantém acordado, mais forte se torna o desejo de dormir.
Porém, ao longo do dia há uma série de fatores que podem afetar a nossa homeostase, como sedentarismo, alimentação inadequada e estresse. Para neutralizar esses fatores e adormecer, tornou-se comum a ingestão de pílulas para dormir. Porém, existem inúmeras alternativas não farmacológicas para dormir melhor, incluindo terapia cognitivo-comportamental, meditação da atenção plena e atividade física.
A rotina, no entanto, talvez seja a principal aliada para quem busca boas noite de sono. Seguir horários regulares para dormir e acordar protege a qualidade do sono, torna mais fácil e rápido adormecer e garante que se tenha a quantidade de sono necessária. Rotinas consistentes de sono melhoram os ritmos circadianos (ciclos de 24h sobre os quais se baseiam os organismos), seja no dia a dia, seja em períodos de férias.
A atividade física também é uma importante prática para melhorar o sono, pois atua na redução de fatores que prejudicam o sono, como doenças, sobrepeso, inflamação crônica e mal-estar psicológico. O exercício apenas não é recomendado antes de dormir, devendo ser mantido um intervalo de quatro horas.
Confira mais dicas sobre como dormir melhor:
Um banho quente antes de dormir pode ajudar a estimular uma melhor circulação sanguínea e, ironicamente, mantê-lo mais fresco à noite. Isso ajuda a evitar acordar durante a noite e oferece melhores chances de concluir as quatro etapas do sono. O banho também alivia a tensão muscular e facilita o sono. O banho não precisa ser tão longo. Apenas 10 minutos, uma ou duas horas antes de dormir, já é o suficiente.
As telas em geral, como das TVs e dos celulares, dificultam o sono. Isso ocorre porque elas emitem luz azul, que bloqueia a liberação de melatonina e pode atrasar em uma hora o adormecimento – mesmo quando se vai dormir mais tarde. O ideal é deixar de usar esses dispositivos uma hora antes de ir para a cama.
O álcool é frequentemente considerado um auxílio para dormir, mas na verdade atrapalha os ritmos circadianos e suprime a melatonina. Assim como a cafeína, o álcool afeta o corpo horas após o consumo. A dica é planejar seu consumo com antecedência, se alimentando e se hidratando, e evitar o consumo excessivo.
As vitaminas do complexo B ajudam o corpo a regular o triptofano, um aminoácido que ajuda o corpo a produzir melatonina. O magnésio também é um mineral importante quando se trata de dormir, ajudando a relaxar os nervos e promover a circulação saudável.
Comer alimentos saudáveis também auxilia. Alimentos com potássio, como bananas e certos vegetais, são especialmente úteis. Peixes gordurosos como salmão, atum e truta também são ótimos auxiliares do sono.
Um novo estudo descobriu que as pessoas que acordam com alarmes melódicos pela manhã ficam menos grogues do que aquelas que usam alarmes simples. Os pesquisadores levantaram a hipótese de que os alarmes melódicos promovem a excitação natural do corpo, ajudando a nos tornar mais alertas e atentos pela manhã. Por outro lado, descobriram que um alarme simples tende a confundir o cérebro e impedir o sono, o que não é o ideal.
A cama não é um espaço multiuso. Quanto mais o corpo for treinado para associar a cama ao sono, mais fácil ele conseguirá adormecer nesse espaço. Assim, devem ser evitadas na cama atividades como ler, fazer palavras cruzadas, comer, navegar pelas redes sociais ou assistir TV. Como regra geral, ela deve ser reservada para duas atividades principais: dormir e fazer sexo.
Diversas pesquisas indicam que uma temperatura ligeiramente baixa, em torno de 20 graus, ajuda o corpo a adormecer mais rápido. Neste cenário, o sono R.E.M. também é atingido mais rapidamente, facilitando que o organismo se recupere mais rapidamente.
Quanto mais escuro o quarto, melhor é o sono. A luz influencia o estágio de vigília do sono, de modo que, quanto mais escuro for o quarto, mais tempo o organismo estará nos estágios restauradores.
Estudos recomendam que se defina um tempo limite para a ingestão de cafeína. Este estimulante tem uma presença prolongada, atuando por muitas horas após o consumo. Para maior eficiência do sono, é recomendado que se evite o consumo de cafeína pelo menos 4 horas antes de dormir.
Consistência é a chave. Esboce uma rotina de dormir na qual seus filhos possam se apoiar rotineiramente: “Às 20h30 trocamos de pijama, escovamos os dentes e escolhemos um livro para ler. ” Isso ajudará seus filhos a desenvolver hábitos regulares de sono e promover um sono melhor.
Para combater os efeitos negativos que a luz azul pode ter no sono, peça aos seus filhos que evitem as telas mais de uma hora antes de dormir e em geral durante o dia.
As crianças têm dificuldade em adormecer quando estão estressadas. O estresse leva a um aumento no cortisol, um hormônio que é uma parte importante do ciclo sono-vigília. Para limitar o estresse, verifique se há tempo suficiente entre as atividades físicas e escolares e a hora de dormir.
Como vimos ao longo do texto, o sono de qualidade aparece não apenas como promotor de saúde, mas, quando em falta, atua também como sintoma de desequilíbrios em outras áreas. Em nosso organismo, tudo está interconectado. Informe-se sobre as relações entre alimentos naturais e qualidade de vida e entre exercício físico e saúde.
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