O livro de Aamodt devasta o campo dos livros de dietas – e, na verdade, toda a indústria de dietas –, com a afirmação radical que é, de fato, a perda de peso gerada por dietas que leva seu corpo a recuperar o peso perdido – querendo ou não. (Por exemplo, o metabolismo do seu corpo cai precipitadamente após a perda de peso, ou seja, você tem que comer muito, muito menos do que quando você estava fazendo dieta, para não engordar.)
O livro divisor de águas de Aamodt terá um efeito profundo sobre o grande passatempo americano de fazer dieta, dada a enorme quantidade de dados, ciência e inteligência em sua criação. Mas o que mais pode interessar as mentes científicas é a pesquisa fascinante que Aamodt fez sobre a relação entre o bioma humano, nossa colônia de trilhões de bactérias que vivem no cólon, e a perda ou ganho de peso. Como ela descreve aqui, a pesquisa não dá respostas fáceis sobre a perda de peso, demonstrando sim quão complexo (e involuntário) nosso peso realmente é.
Por que precisamos das bactérias do intestino?
O intestino humano contém dezenas de trilhões de bactérias; as nossas células são muito mais bacterianas que humanas. Apoiamos essas ‘caroneiras’ porque precisamos delas para digerir nossa própria comida. Estes bichinhos residentes se dividem em três grupos principais, chamados de bacteroidetes, firmicutes e actinobactérias, e quebram partes do nosso alimento, que de outra forma seriam desperdiçados. As bacteroidetes até mesmo produzem vitamina K, um nutriente necessário. Nossas bactérias nos ajudam a extrair muito mais energia a partir de alimentos do que as nossas enzimas digestivas podem fazer por conta própria.
Em um experimento fascinante, pesquisadores produziram “camundongos livres de germes”, sem quaisquer bactérias intestinais, e os mantiveram em uma câmara de isolamento. Estes camundongos comeram 29% mais alimentos, mas tinham 42% menos gordura corporal do que os camundongos criados normalmente. (Comer mais e pesar menos pode ser o sonho de muita gente, mas isto teria sido uma séria desvantagem em períodos em que o alimento era difícil de se obter, uma realidade durante a maior parte da história humana.)
Se os camundongos livres de germes recebiam transplante de bactérias do intestino de um animal normal – sim, isso é uma maneira educada de dizer ‘transplante de cocô’ –, eles comiam 27% menos comida, o mesmo que um camundongo normal, enquanto sua gordura corporal aumentava em 60% dentro de duas semanas. Mas quando os camundongos livres de germes eram transplantados com bactérias do intestino de um animal obeso ou uma pessoa obesa, eles ganhavam cerca de duas vezes mais peso de quando as bactérias vinham de um camundongo magro.
Como as bactérias ajudam a digestão…
Os tipos de bactérias comuns na obesidade levam ao ganho de peso, porque são especialmente eficientes em nos ajudar a obter mais energia a partir dos alimentos, ajudando a quebrar os carboidratos complexos, como a celulose, xilano e pectina. Para as pessoas que comem uma grande quantidade de frutas e legumes, aquela eficiência na digestão pode fornecer um extra de 140 a 180 calorias por dia.
As bactérias do intestino influenciam a absorção de nutrientes de várias formas: por exemplo, retardando o movimento do alimento através do intestino para permitir uma extração mais completa dos nutrientes, e através do aumento da produção de uma enzima que move a glicose a partir do intestino delgado para o sangue. Elas também suprimem uma enzima denominada lipoproteína lipase (LPL), que limita a capacidade das células gordurosas a tomar ácidos graxos e triglicerídeos do sangue; a supressão desta enzima leva a um aumento do armazenamento de gordura. Este mecanismo parece ser particularmente importante para a obesidade, quando estudado em camundongos. Os animais livres de germes ganham apenas 10% de peso em vez de 60%, se um regulador desta via é bloqueado depois de receberem o transplante de bactérias intestinais. Nossas bactérias intestinais também reduzem o uso de gordura como energia no fígado e músculos.
As bactérias intestinais são o mais novo segredo para a perda de peso? Ainda não.
Embora os pesquisadores entendam alguns dos detalhes sobre como as bactérias intestinais influenciam o peso, eles ainda não descobriram como aplicar este conhecimento. Uma possibilidade é uma espécie bacteriana chamada Akkermansia muciniphila, que evita que os camundongos ganhem peso em uma dieta de alta gordura. Um ensaio clínico desta espécie está em curso em pessoas, mas levará tempo até que uma terapia do microbioma para a obesidade esteja pronta.
A diferença fundamental entre a pesquisa animal e a terapia clínica é que os médicos não podem transplantar bactérias em pessoas livres de germes; os pesquisadores têm de lidar com as espécies que já estão presentes no intestino. Alterar o microbioma se refere mais como uma tentativa de restaurar um habitat danificado (com possíveis interações entre espécies, difícil de prever), do que usar um medicamento. Diferentes espécies de bactérias competem umas com as outras, podendo um tipo dominante não aceitar um tipo que um médico esteja tentando colocar. O número de resultados possíveis é um quebra-cabeças bem complicado.
Outro problema com a aplicação desta pesquisa é definir como seria uma população desejável de bactérias intestinais. Como um primeiro palpite, poderíamos tentar replicar o microbioma ancestral, copiando as bactérias do intestino de modernos caçadores e coletores. Há certamente algumas diferenças importantes. Caçadores-coletores têm um conjunto muito mais diversificado de espécies do que o nosso, com estimativas variando para mais de 50% ou o dobro. Mas há também alguns problemas com a ideia de replicar um microbioma. Micróbios do intestino variam entre diferentes populações em caçadores-coletores e mudam sazonalmente acompanhando a mudança das fontes de alimentos, sugerindo que provavelmente não havia um estado ancestral único. Mais importante ainda, as bactérias do intestino dessas populações são adaptadas aos seus próprios estilos de vida e podem não jogar bem com o nosso estilo moderno. As bactérias que se especializam na digestão de fibras teriam problemas para encontrar algo para comer nas vísceras de um suburbano típico.
O número das diferentes espécies bacterianas no intestino também podem ser importantes. As pessoas com um conjunto menos diversificado delas são mais propensas à obesidade e ter síndrome metabólica (hipertensão arterial, açúcar no sangue, colesterol e circunferência da cintura, que são fatores de risco para doenças cardíacas e diabetes). Na verdade, os pesquisadores podem prever se as pessoas são gordas ou magras de forma mais eficaz através de seu genoma bacteriano (90% de precisão) do que de seus próprios genes (58% de precisão).
Como os antibióticos, quando indevidamente utilizados, podem estar nos deixando mais gordos…
A diversidade das bactérias intestinais pode ser reduzida por tratamento com antibióticos, que não só mata as bactérias, mas também favorece determinadas espécies sobre as outras.
Quando os pesquisadores dão a camundongos antibióticos de baixa dosagem desde o seu nascimento, ocorre uma maior proporção de firmicutes e menos bacteroidetes (o padrão associado com a obesidade), e mais tecido adiposo é formado, em comparação com seus companheiros de ninhada que não receberam antibióticos. Quando os camundongos recebem antibióticos durante 4 semanas na infância, sua população de bactérias intestinais gradualmente volta ao normal, mas, em seguida, na adolescência desenvolvem obesidade e problemas metabólicos, incluindo o acúmulo de gordura no abdômen e no fígado. Colocando os animais tratados com antibióticos em uma dieta rica em gordura produz-se efeitos mais fortes ainda, especialmente nos machos, que são mais suscetíveis à obesidade induzida por dieta.
Uma relação semelhante pode ocorrer em pessoas. Por exemplo, entre os bebês canadenses que não receberam antibióticos em seu primeiro ano de vida, 18,2% apresentaram sobrepeso ou obesidade na idade de 12 anos. Em contraste, 32,4% dos bebês expostos a antibióticos apresentaram excesso de peso ou obesidade. Após o ajuste para possíveis fatores de confusão, como peso ao nascer e peso da mãe, a relação manteve-se estatisticamente significativa em meninos, mas não meninas. Os meninos tinham mais de cinco vezes mais chances de se tornarem obesos aos 12 se recebessem antibióticos na infância, e quase três vezes mais probabilidade de ter uma grande quantidade de gordura visceral, o tipo mais perigoso para a saúde. Da mesma forma, entre as mais de 27.000 crianças dinamarquesas nascidas de mães com peso normal, os antibióticos nos primeiros seis meses de vida previu uma chance 54% maior de sobrepeso aos 7 anos de idade. No entanto, um resultado oposto foi achado para crianças de mães com sobrepeso, que receberam antibióticos: tinham metade de chance para apresentarem sobrepeso. Isto pode sugerir que o efeito dos medicamentos pode variar, dependendo da população inicial das bactérias intestinais na criança.
Por agora, podemos tirar um par de lições a partir desta pesquisa. Os pais devem minimizar o uso de antibióticos em crianças, especialmente no primeiro ano de vida, porque as mudanças nas bactérias do intestino nessa idade podem ter consequências duradouras. Em média, uma criança nos Estados Unidos recebe de dez a vinte cursos de antibióticos antes dos 18 anos, aumentando os riscos de asma, alergias e doença inflamatória do intestino, além de obesidade e diabetes.
E também, todos nós devemos pensar duas vezes antes de culpar as pessoas por seus pesos. A composição de nossas bactérias intestinais afeta profundamente o nosso corpo, mas ninguém sabe ainda como usar este conhecimento para mudá-lo.
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