Desenvolvidos inicialmente para o tratamento do diabetes tipo 2, os análogos de GLP-1 também têm ganhado destaque no manejo da obesidade. Mas como exatamente esses medicamentos atuam no organismo? Há efeitos além do emagrecimento e do controle da glicose? É isso que vamos te explicar por aqui!
Neste texto, você vai entender como o hormônio GLP-1 atua no organismo e qual o papel dos seus análogos em diferentes contextos, além de estratégias que podem ajudar a otimizar o tratamento de forma segura, mantendo o bem-estar. Confira!
O que é GLP-1 e quais as suas funções?
O GLP-1 (peptídeo 1 semelhante ao glucagon) é um hormônio natural produzido pelo intestino em resposta à ingestão de alimentos. Ele desempenha um papel central no controle da glicose sanguínea, integrando sinais que regulam fome, saciedade e metabolismo energético.
O GLP-1 é formado a partir de uma proteína maior chamada proglucagon. Entre suas funções, destacam-se:
- Estimular a liberação de insulina pelas células beta do pâncreas, especialmente quando os níveis de glicose estão elevados, como quando nos alimentamos;
- Reduzir a produção de glucagon, hormônio “da fome”, que aumenta a glicose sanguínea;
- Retardar o esvaziamento do estômago, aumentando a sensação de saciedade;
- Estimular o cérebro a produzir hormônios de saciedade, que reduzem a ingestão alimentar;
- Atuar no metabolismo lipídico, contribuindo para reduzir triglicerídeos, colesterol LDL e o acúmulo de gordura no fígado.
O que são os análogos de GLP-1?
Os análogos de GLP-1 são medicamentos que imitam a ação do hormônio GLP-1 e são usados principalmente no tratamento do diabetes tipo 2 e da obesidade.
Normalmente, o GLP-1 produzido de maneira natural pelo organismo tem efeito curto – dura apenas 1 a 2 minutos, pois é rapidamente degradado pela enzima DPP-4, no intestino. Nos análogos de GLP-1, essa limitação foi modificada: eles são desenvolvidos para resistir à DPP-4, permanecendo mais tempo ativos no corpo e promovendo efeitos mais duradouros. Essa ação prolongada também está associada aos possíveis efeitos colaterais dos medicamentos, que serão abordados mais adiante.
Como foram desenvolvidos?
O GLP-1 natural foi descoberto nos anos 1980 como hormônio que estimula a insulina e reduz a glicemia, mas não podia ser usado diretamente como remédio porque era “destruído” pelo corpo em menos de 1 minuto. A virada aconteceu nos anos 1990, quando John Eng descobriu a exendina-4 no veneno do lagarto Gila monster, substância parecida com o GLP-1 humano, mas com efeito prolongado.
Essa descoberta levou ao primeiro medicamento baseado em GLP-1 para diabetes, a exenatida, aprovada pelo FDA, a agência de saúde pública dos Estados Unidos, em 2005. Depois vieram versões mais potentes, duradouras e com menos efeitos colaterais, como a liraglutida e a semaglutida, que hoje são amplamente usadas para o manejo da diabetes e controle do peso corporal.
Efeitos dos análogos de GLP-1 no organismo
Além de controlar a glicemia, os agonistas de GLP-1 apresentam outros efeitos já observados em estudos:
- Prolongam a saciedade ao retardar o esvaziamento gástrico, ajudando a reduzir a ingestão de alimentos;
- Reduzem a produção de glucagon;
- Protegem as células beta do pâncreas, diminuindo sua morte e estimulando a sua proliferação;
- Influenciam na saúde cardiovascular, equilibrando a pressão arterial e o colesterol total, o que pode auxiliar para diminuir o risco de infarto e AVC;
- Agem no cérebro, estimulando centros de saciedade, além de proteger neurônios;
- Aumentam a diurese e a eliminação de sódio pelos rins;
- Podem influenciar na formação óssea;
- Diminuem a produção de glicose no fígado e o acúmulo de gordura intra-hepático;
- Melhoram a sensibilidade à insulina nos músculos, estimulando a captação de glicose por esse órgão.
Quais são os análogos de GLP-1 mais populares e disponíveis no Brasil?
No Brasil, a Anvisa aprovou alguns desses medicamentos análogos de GLP-1. Eles costumam ser mais reconhecidos pelos nomes comerciais, como Ozempic® (semaglutida), Saxenda® (liraglutida) e Mounjaro® (tirzepatida).
Com exceção da tirzepatida, que atua como agonista-duplo – de GLP-1 e de GIP (hormônio similar ao GLP-1) e por isso pode ter efeitos e indicações um pouco diferentes, como para o tratamento do lipedema, por exemplo, os demais medicamentos agem de forma semelhante, “imitando” a ação do hormônio GLP-1 no organismo. Entretanto, alguns podem ser mais indicados para o controle da diabetes enquanto outros para a redução de peso.
É importante lembrar que esses medicamentos só podem ser adquiridos com prescrição médica e retenção da receita, devido ao seu uso controlado.
Para o que são usados os análogos de GLP-1?
Esses medicamentos atuam principalmente em duas frentes: no tratamento da diabetes tipo 2 e no manejo da obesidade. A seguir, você vai descobrir como eles funcionam em cada situação e como a ciência explica seus efeitos no organismo.
Manejo da diabetes
A relação entre os análogos de GLP-1 e o manejo da diabetes acontece por conta dos efeitos desses medicamentos no aumento da secreção de insulina (quando o açúcar no sangue está alto), na redução do hormônio glucagon, na proteção das células do pâncreas e na diminuição do apetite e ingestão alimentar que, consequentemente, ajuda a controlar também o aumento da glicose após as refeições.
Por esses motivos, esses medicamentos ajudam a manter a glicose estável, com muito baixo risco de causar hipoglicemia, que é a queda de açúcar no sangue, especialmente em pessoas com diabetes tipo 2.
Controle da obesidade
Estudos especulam que pessoas com obesidade produzem menos GLP‑1, o que evidencia a importância desse hormônio na fisiopatologia da condição. Há alguns anos, os análogos de GLP-1 começaram a ser usados como estratégia na redução de peso por conta de dois fatores principais: aumento da sensação de saciedade e diminuição da ingestão alimentar.
O cérebro possui receptores de GLP-1 em diversas regiões envolvidas na regulação da fome e da saciedade, integrando sinais do chamado eixo intestino-cérebro. O mecanismo de ação desses medicamentos no contexto da obesidade ocorre em regiões como o hipotálamo, ativando neurônios que promovem a saciedade e inibindo os que estimulam a fome.
Em outros órgãos, retardam o esvaziamento do estômago e diminuem a motilidade intestinal, prolongando a sensação de plenitude e contribuindo para uma menor ingestão de alimentos.
Dessa forma, eles podem ajudar na redução de, em média, 15% a 25% do peso corporal após cerca de 1 ano de tratamento. No entanto, é importante destacar que a quantidade de peso eliminada pode variar dependendo do medicamento, da dose, do tempo de tratamento e, é claro, da individualidade e dos hábitos de cada paciente.
Quais os efeitos colaterais dos análogos de GLP-1 no organismo?
Apesar dos seus bons resultados no controle do diabetes tipo 2 e da obesidade, os análogos de GLP-1, como todo medicamento, podem apresentar efeitos colaterais indesejados durante o uso, especialmente no início do tratamento. Entender esses impactos é fundamental para um tratamento seguro e para evitar complicações.
Também, é importante pontuar que a ocorrência e a intensidade desses efeitos dependem do medicamento utilizado, da dosagem, da individualidade de cada um e do acompanhamento médico e nutricional. Além disso, estratégias podem ser utilizadas para evitá-los ou minimizá-los, conforme explicado mais adiante.
Efeitos no sistema gastrointestinal
Durante o uso dos análogos de GLP-1, é comum surgirem efeitos gastrointestinais, principalmente no início do tratamento. Os sintomas mais relatados são náusea, vômito, diarreia, constipação e dispepsia (sensação de queimação ou desconforto).
Isso acontece porque o medicamento impacta uma série de mecanismos no sistema gastrointestinal, como o retardo do esvaziamento gástrico, a diminuição da motilidade do intestino e a redução do apetite que, por sua vez, interfere no equilíbrio de nutrientes importantes para a saúde intestinal, especialmente as fibras.
Esses fatores podem alterar a microbiota intestinal – conjunto de microrganismos que influencia a digestão e a absorção de nutrientes, a produção de vitaminas e de outros compostos benéficos, como ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), e a regulação de hormônios e neurotransmissores ligados ao bem-estar, à fome e à saciedade.
Impactos na saúde muscular
Em qualquer processo de emagrecimento é comum que, além de gordura, se perca também a massa magra, que inclui músculos, ossos, órgãos, outros tecidos e água. Entretanto, o ideal é sempre tentar minimizar essa perda.
Acontece que durante o uso de análogos de GLP-1, os estudos indicam que a diminuição da massa magra pode ser ainda mais significativa, representando entre 20% a 50% do peso total perdido, valores semelhantes aos observados em dietas restritivas ou cirurgias bariátricas.
Em outras pesquisas são identificadas variações maiores, podendo chegar a 60%, o que indica que mais da metade do peso perdido foi de massa magra, principalmente músculos, ao invés de gordura.
A redução de massa magra pode ter consequências importantes, como fraqueza, indisposição, flacidez, entre outras, que podem levar ao desenvolvimento da sarcopenia e ainda dificultar a realização de tarefas simples do dia a dia.
Além desses impactos na estrutura corporal, também pode haver diminuição do gasto energético, o que faz com que o organismo use menos calorias e estimule o corpo a estocar mais gordura ao invés de músculos, fatores que podem dificultar a manutenção do peso após o fim do tratamento com GLP-1.
Influência na sensação de sede
Manter a hidratação é essencial para a saúde e durante o uso de análogos de GLP-1 esse ponto merece ainda mais atenção. Estudos mostram que alguns desses medicamentos podem reduzir a ingestão de líquidos e a produção de urina.
É que, ao influenciar a saciedade, não é apenas o apetite que é afetado: a sensação de sede também pode diminuir, fazendo com que seja mais difícil perceber quando o corpo precisa de água.
Além disso, a desidratação pode ocorrer especialmente no início do tratamento, por conta de efeitos colaterais comuns, como diarreia e vômito, que favorecem ainda mais a perda de líquidos.
Consequências na nutrição do organismo
A redução do apetite e da ingestão de alimentos pode levar a um menor consumo de nutrientes essenciais. Além disso, os efeitos gastrointestinais dos medicamentos podem comprometer ainda mais a absorção de nutrientes, aumentando o risco de deficiências ou piorando o quadro daquelas pré-existentes.
Pesquisas indicam que os nutrientes que geram mais preocupação nesses casos são o ferro, o cálcio, o magnésio, o zinco e as vitaminas A, D, E, K, B1, B12 e C.
Os sinais evidentes de deficiência nutricional podem incluir fadiga excessiva, queda de cabelo, ressecamento ou coceira na pele, fraqueza muscular, dificuldade na cicatrização de feridas e aparecimento incomum de hematomas. No entanto, há circunstâncias nas quais a deficiência pode ser silenciosa.
É importante salientar, também, que alguns indivíduos já podem iniciar o tratamento com essa deficiência, como no contexto da obesidade. Por conta de hábitos alimentares desequilibrados ou em decorrência de alterações metabólicas que afetam a forma como o organismo absorve e utiliza os nutrientes, estima-se que pessoas com obesidade podem ter maior predisposição a deficiências nutricionais, o que pode ser agravado durante o uso dos medicamentos.
Como otimizar o tratamento e minimizar os efeitos indesejados dos análogos de GLP-1?
Os análogos de GLP‑1 são medicamentos que podem ser recomendados para a perda de peso acelerada e para o controle da diabetes, mas funcionam melhor quando combinados com hábitos saudáveis.
Adotar mudanças na alimentação e no estilo de vida antes, durante e após o tratamento ajuda a potencializar os resultados, preservar massa muscular e óssea, prevenir ou corrigir deficiências nutricionais e manter os resultados alcançados mesmo quando o tratamento terminar. A integração do remédio com práticas saudáveis torna o tratamento mais eficaz e sustentável. Isso inclui algumas dicas, como:
Manter o acompanhamento médico e nutricional regular
Com a popularização dos análogos de GLP-1, sociedades médicas brasileiras têm reforçado o alerta contra o uso indiscriminado desses medicamentos apenas por motivos estéticos. Por isso, eles só podem ser utilizados mediante prescrição médica.
O acompanhamento com profissionais capacitados, como médico e nutricionista, é essencial para avaliar as necessidades individuais, reduzir as chances de efeitos colaterais, favorecer a nutrição adequada e prevenir o reganho de peso, quando utilizado para esse fim.
Realizar atividades físicas
A prática regular de exercícios é fundamental para manter o organismo saudável, pois ajuda a preservar a massa magra, fortalece o organismo durante o tratamento e contribui para manter os resultados no longo prazo.
Estudos mostram que durante o emagrecimento a combinação de dieta e exercícios, principalmente musculação, favorece uma maior perda de gordura corporal em vez de massa muscular. Isso pôde ser visto em um experimento no qual mulheres que seguiram uma dieta com e sem exercícios tiveram o mesmo emagrecimento total, mas apenas quem se exercitou manteve a massa muscular.
O treino de força deve ser prioridade, pois minimiza a perda muscular durante a redução de peso, favorecendo a perda de gordura e estimulando a hipertrofia. No entanto, a combinação com atividades aeróbicas também pode ser recomendada: elas potencializam o gasto calórico, melhoram a saúde cardiovascular e complementam os efeitos do treino de força.
Cuidar do intestino
Os análogos de GLP-1 podem causar constipação, diarreia e outros desconfortos gastrointestinais, principalmente no início do tratamento.
Para amenizar esses efeitos, aumente o consumo de fibras por meio de alimentos como frutas, verduras, legumes e grãos integrais. Em casos nos quais não seja possível atingir a recomendação somente pela alimentação, o uso de suplementos pode ser indicado pelo médico ou nutricionista.
Também é fundamental para a saúde intestinal manter uma boa hidratação e praticar exercícios físicos. Esses cuidados favorecem a digestão, regulam o trânsito intestinal e reduzem os incômodos ao longo do tratamento.
Além disso, o médico ou nutricionista pode recomendar a suplementação de probióticos. Esses nutrientes também ajudam a equilibrar a saúde intestinal, o que é fundamental para a absorção de nutrientes.
Manter a hidratação
Durante o uso de análogos de GLP-1, manter-se hidratado é essencial – mesmo sem sentir sede. A água favorece a digestão, regula o trânsito intestinal e equilibra líquidos e minerais no corpo.
Para facilitar, tenha sempre uma garrafa por perto, beba em pequenos goles ao longo do dia e consuma frutas e verduras ricas em água.
Além disso, apostar no consumo de bebidas com eletrólitos pode ajudar na reposição dos minerais responsáveis pelo transporte de água para dentro das nossas células.
Priorizar o consumo adequado de proteínas
As proteínas exercem um papel fundamental na construção dos músculos, ajudando a fortalecer a massa magra, prevenindo flacidez, perda de força e diminuição da massa óssea e muscular, problemas comuns em dietas com restrição calórica e perda de peso rápida, como no uso de análogos do GLP-1.
Em geral, a quantidade de proteína diária recomendada para quem está em tratamento é de 1,2 a 2,0 g de proteína por quilo de peso corporal por dia, distribuídas ao longo das refeições, sempre seguindo a orientação do médico ou nutricionista para que esse cálculo seja individualizado. Devido à baixa ingestão alimentar, pode ser necessário recorrer a suplementos proteicos para atingir as necessidades, como whey protein, proteínas veganas, aminoácidos ou colágeno.
Se atentar à nutrição adequada do organismo
A maior saciedade e os efeitos gastrointestinais durante o uso de agonistas de GLP-1 podem reduzir significativamente a ingestão alimentar. Isso dificulta alcançar, apenas pela dieta, todos os nutrientes que o corpo precisa.
Por isso, além de priorizar alimentos nutritivos sempre que possível – como leguminosas, frutas, verduras, carnes e grãos integrais, muitas vezes é necessário recorrer à suplementação orientada por profissionais de saúde. Essa estratégia pode ajudar a prevenir ou corrigir deficiências de vitaminas, minerais e proteínas, que podem comprometer a saúde ao longo do tratamento.
Também, é importante acompanhar com seu médico e nutricionista a composição corporal e avaliar periodicamente os níveis de nutrientes no sangue. Dessa forma, é possível ajustar a dieta e os suplementos para garantir energia, preservação de massa magra e bom funcionamento do organismo.
Para saber mais sobre essas estratégias, acesse o guia de suporte nutricional inteligente durante o uso de análogos de GLP-1 e veja como favorecer um tratamento saudável e seguro.





